quinta-feira, 15 de maio de 2014

Situação política na Tailândia: estala a bomba e o foguete vai no ar

Há 2 meses, terminei o meu primeiro post neste blogue com a seguinte frase:
"O fim do “Bangkok Shutdown” está longe de representar o regresso à Normalidade. Tal como a vida em Asoke, a situação política na Tailândia está num período de hibernação, com o objectivo de repensar estratégias e planear os próximos passos. Resta saber até quando." Pois, o tal período de hibernação chegou ao fim e, na última semana, acontecimentos de substancial impacto político têm-se sucedido e auguram uns meses de debate aceso na Tailândia.
Tudo começou na passada quarta-feira, dia 7, quando o Tribunal Constitucional decidiu condenar a Primeira Ministra Yingluck Shinawatra por abuso de poder num caso que remonta a 2011, quando assumiu o cargo, e decidiu substituir o então chefe do Conselho de Segurança Nacional por alguém da sua confiança política (que por acaso é irmão da sua ex-cunhada, só por acaso). O resultado da condenação foi a  demissão do cargo, juntamente com outros 9 ministros do seu executivo. Foi nomeado um Primeiro Ministro Interino e as movimentações políticas em torno do novo executivo não se fizeram esperar, com manifestações de ambas as facções, pressões através dos media e negociatas paralelas.

Ora, se em Portugal de cada vez que o aclamado "tacho" político fosse atribuído, o Tribunal Constitucional tomasse medidas deste género, teríamos mudanças de governo mais recorrentes do que por alturas do PREC. É claro que a Tailândia não é um exemplo de como estas situações devem ser tratadas, pois não há uma clara isenção dos Tribunais nestes casos, onde as decisões só parecem ser céleres quando envolvem uma determinada cor política, enquanto para outras tudo se arrasta, se ignora e "esquece", tal qual como no nosso rectângulo.

O sistema político tailandês está longe da maturidade e as constantes alterações à Constituição levam a impasses que são complicados de entender ou explicar, principalmente para os estrangeiros. Existem vários partidos, mas o controlo das instituições está distribuído por apenas 2: O Pheu Thai é o partido que venceu as eleições em 2011, tendo maioria no Parlamento e sendo o actual Governo; o Partido Democrata é o maior partido da oposição, com maioria no Senado e influência importante nos Tribunais. O que acontece usualmente? O Parlamento prepara propostas de lei, o Senado rejeita, o Governo passa por cima do Senado, que eventualmente apresenta queixas ao Supremo Tribunal ou ao Constitucional para acabar com tudo. É uma visão demasiado simplista do que se passa, eu sei, mas ao fim de quase 3 anos a viver aqui, é aquilo que eu tenho visto acontecer, por mais de uma vez. 

Entretanto as manifestações regressaram no fim-de-semana, na tentativa de pressionar as decisões que terão de ser tomadas nos próximos dias, com demonstrações de força de ambas as facções, mas sem confrontos entre as pessoas. De um lado a batalha final nº 472 do PDRC de Suthep e do outro o aclamar de que "o meu voto conta!" dos camisas vermelhas de Jatuporn. Ambos são personagens que dizem não querer assumir cargos, mas que estão constantemente na ordem do dia.


Desde que a demissão da Primeira Ministra foi anunciada, que não se sabe bem o que virá a acontecer, mas ao mesmo tempo muitas coisas aconteceram:

- Dia 7: Alguns ministros mantiveram o cargo e foi logo apontado um PM interino;
- Dia 8: Aproveitando o balanço, o Conselho Nacional Anti-Corrupção anuncia que vai tentar banir a ex-Primeira Ministra da política por 5 anos devido a gestão danosa;
- Dia 9: O PDRC manifesta-se nas nas ruas e anuncia o Senado e o Supremo Tribunal como as únicas instituições vigentes, que têm assim de nomear um novo Governo e Primeiro-Ministro interinos (apesar de já haver, mas estes que estão lá não prestam);
- Dia 10: Os "vermelhos" vão para a rua protestar e o seu líder anuncia que caso o Senado e o Supremo Tribunal tomem alguma medida, essa deve ser considerada ilegal e o país irá mergulhar em guerra civil; 
- Dia 11:  Entretanto o PDRC sai do Parque Lumpini, que ocupava desde o início do ano, e monta a sua base de operações dentro de um dos edifícios do campus do Governo;
- Dia 12: O Centro de Administração da Paz e da Ordem anuncia que vai enviar uma "SWAT team" para prender todos os líderes do PDRC, incluindo Suthep, que estão no campus do Governo (provavelmente será adiado porque o Chuck Norris tem uma acção de beneficiência nesse dia e não pode ir);
- Ainda no dia 12: O Exército abandona o Quartel-General situado perto do campus do Governo, para evitar problemas. Também decide desmantelar muitas tendas de ajuda militar, que estavam espalhadas um pouco por toda a cidade (incluindo a que tinham no edifício onde trabalho);
- Dia 13: Suthep e o seu PDRC entram nas premissas do Parlamento e interrompem uma sessão do Senado. O mediador do Senado permite a Suthep participar na reunião, mas os senadores pro-governo desaprovam o sucedido e abandonam a sessão. Ficam os "amigos" a debater à porta fechada os próximos passos;
- Ainda dia 13: Os EUA (metem o bedelho em tudo) "aconselham" o Exército tailandês a deixar o país prosseguir o seu caminho democrático e a não preparar qualquer golpe de Estado (já vai em 11 golpes militares desde a implementação da Democracia em 1932, com o último em 2006);
- Hoje: O Pheu Thai denuncia as acções tomadas pelo Senado, ao deixar um "criminoso" (Suthep) participar numa das sessões, e pede a sua dissolução acusando o seu moderador de insurreição;

É difícil fazer previsões para o que poderá acontecer de seguida. Com a família Shinawatra fora de cena, o PDRC tenta chegar ao poder, mas o Senado sabe que nada pode fazer contra um executivo eleito pelo povo. Perante a recusa dos "vermelhos" pro-governo de negociar uma solução com o Senado (eles aceitam o executivo interino que hoje se encontra em funções), o impasse continua até que uma solução drástica aconteça.

A meu ver, o imbróglio político existente na Tailândia tem demasiados nós e custa desfazê-los quando não há uma clara vontade e acordo de todos os intervenientes. As instituições legislativas e executivas atropelam-se pelo poder e a palavra final é constantemente remetida para os Tribunais, que têm um poder muito mais abrangente que o mero poder judicial. O poder é demasiado centralizado, visto que quase todos os governos regionais são nomeados, juntamente com o executivo  central, pelo partido que vence as eleições legislativas (à excepção de Bangkok e Phuket que têm sufrágio directo), o que leva a muitas queixas de algumas regiões relativamente a decisões tomadas contra a sua vontade. Para além da sombra constante do Exército e de um golpe de Estado iminente.

Estala a bomba e o foguete vai no ar...


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