terça-feira, 1 de setembro de 2015

A bomba de Bangkok: uma investigação Tailandesa, com certeza.

No passado dia 17 de Agosto,  Bangkok foi abalada por uma explosão que acabou por fazer manchete globalmente por toda a comunicação social. O balanço foi de 20 mortos e mais de uma centena de feridos, deixando mais uma marca difícil de sacudir na nossa aventura tailandesa. A nossa primeira reacção é deixar o aviso de que estamos todos bem e que não há motivos de preocupação, mas cá por dentro trememos e hesitamos, porque na realidade não sabemos bem como reagir a tudo isto.

Era mais um dia como outro qualquer, estava eu a chegar a casa pelas 7 e picos quando recebo uma chamada da minha chefe avisando-me que tinha havido uma bomba em Ratchaprasong, junto ao Centro Comercial Central World. A reacção imediata de tentar saber o que se passa levou a um pequeno surto de pânico aqui por casa... Sabíamos perfeitamente que aquele cruzamento é um dos mais movimentados da cidade, por onde já passámos inúmeras vezes a pé, de tuk-tuk ou de carro. A CNN foi a primeira estação internacional a dar conta do acontecimento e havia relatos de várias pessoas mortas e dezenas de feridos, sem se saber exactamente onde, como e porquê. Pouco tempo depois exibiam um vídeo de uma câmara de segurança captando o exacto momento da explosão, que ocorre quando uma mota passa na frente do altar de Erawan.


O tempo passa e, mais uma vez, entra-se naquela especulação sobre quem terá perpetrado tal ataque e por que razões o fizeram. Aqui, sempre que rebenta uma bomba ou há qualquer tipo de atentado, ninguém reclama o feito. Aquela cena que esperamos naturalmente, que daqui a pouco estará um barbudo qualquer com um turbante na cabeça a dizer que isto foi para vocês aprenderem a respeitar o profeta, é uma enorme ilusão e um dos estímulos mais parvos que foram induzidos nas nossas mentes ao longo dos últimos anos. Sentimo-nos realmente estúpidos porque na realidade, ninguém se vai pôr a bradar aos sete ventos "fui eu que fiz isto". Mas queríamos tanto que assim fosse, porque nos deixava muito mais seguros do que a completa ignorância de que isto pode ter sido obra de qualquer um, por um motivo completamente desconhecido e que pode acontecer a qualquer momento.

Na CNN começam as entrevistas a "especialistas" sacados sabe-se lá de onde e há uma tentativa da locutora de colar o atentado a uma disputa religiosa porque a bomba estava num "templo tailandês importantíssimo" e por esta altura já só anseio para que a BBC comece a noticiar o atentado... o seu correspondente no Sudeste Asiático, Johnatan Head gosta empolar as suas notícias e reportagens, mas pelo menos não tem aquela fixação Americana pela Guerra religiosa. O altar (não templo) de Erawan tem apenas 50 anos e não tem uma importância histórica na religião budista na Tailândia, até porque é erigido ao Deus Hindu Brahma (para saberem mais leiam o meu post sobre Budismo e folclore). A sua importância está na localização, junto a diversos centros comerciais, hotéis e no cruzamento de duas das principais artérias da cidade, onde transitam milhares de pessoas (locais e turistas) a toda a hora e em qualquer dia da semana.

Depois de alguns telefonemas e mensagens a confirmar que todos no trabalho se encontravam bem, lá nos fomos deitar, porque no dia seguinte tínhamos de sair de casa às 4 da matina para apanhar um avião para a Indonésia. No aeroporto de Don Muang eu esperava polícia a rodos, cães e um controlo apertado na imigração, porque já haviam sido reveladas imagens de um suspeito de camisa amarela a deixar uma mochila no altar pouco antes da explosão, pondo-se em fuga num tuk-tuk na direcção do Parque Lumpini. No entanto, o que encontrámos foi a azáfama do costume, porque o átrio de check-in é demasiado pequeno para a quantidade de passageiros que ali se acumula todas as manhãs para viajar na AirAsia. Polícia apenas na imigração, como é normal, e todos a agirem como se nada se tivesse passado no dia anterior... Sabai sabai...


O motorista da empresa, durante a boleia para o aeroporto, já me dizia que os media tailandeses suspeitavam dos Uyghurs, grupo de nómadas turcos que se fixaram no Noroeste da China há mais de mil anos e que têm reclamado de atitudes discriminatórias por parte do governo Chinês. No ano passado, um atentado na cidade de Kunming foi reclamado por um grupo de activistas Uyghurs e que levaram à morte de 29 civis esfaqueados. Há 2 meses, a Tailândia deportou para a China mais de uma centena de Uyghurs por se encontrarem ilegalmente no país, o que levou a que o Consulado Tailandês em Ankara fosse atacado por manifestantes que protestavam pela falta de protecção dos tailandeses a esta minoria étnica. Nos dias seguintes, rapidamente se começou a mandar gasolina para esta fogueira, com relatos de que todos os voos provenientes e com destino à Turquia estavam a ser amplamente investigados. Inclusivamente, uns dias depois o suposto taxista que levou o suspeito da camisa amarela até Erawan, revelou que este era muçulmano, de certezinha!

Com os turcos a tornarem-se os novos vilões nesta história, a Polícia Tailandesa decidiu atribuir uma recompensa de 3 milhões de Baht (cerca de 75 mil Euros) a quem providenciasse informações relevantes que conduzissem à captura do bombista (ou bombistas). Entretanto, o altar de Erawan foi rapidamente reparado e limpo, para se poder continuar a usar este espaço para oração, numa acção amplamente criticada por diversos media no local, sob o argumento de que não houve tempo suficiente para analisar todas as provas físicas ainda presentes no altar. O Governador de Bangkok prontamente comentou que a Polícia já tinha recolhido todas as provas necessárias e que era imperativo o regresso ao normal quotidiano dos tailandeses. É comum as autoridades tailandesas comentarem que as suas acções não necessitam de ser justificadas a estrangeiros (principalmente em mensagens dirigidas a jornalistas e governantes), porque nós não entendemos o que é ser tailandês e como se deve gerir este país.


Alguns dias se passaram sem que houvesse muitos desenvolvimentos, que levaram a pressões por parte dos media de que a Polícia não tinha quaisquer pistas sobre o atentado e que apenas se estava a basear numas imagens de CCTV para conduzir a sua investigação. Sempre houve muitas questões quanto a idoneidade da Polícia em conduzir investigações, principalmente quando estas se tornam populares nos media internacionais, como foi caso dos assassinatos de turistas ingleses em Koh Tao. E tal como nesse outro caso, quando tudo parecia perdido, de repente a investigação é resolvida e todas as peças do puzzle passam a encaixar: é capturado um indivíduo não identificado, num apartamento carregado de engenhos explosivos e materiais para fabrico artesanal de bombas, com dezenas de passaportes turcos falsificados!

O Chefe da Polícia Tailandesa fez então ontem um comunicado para a televisão, munido de um molho de notas considerável, anunciando que o caso tinha sido resolvido e que a recompensa iria ser distribuída finalmente... pela Polícia Tailandesa!?!? (é que nem fazem um esforço...) O certo é que este indivíduo agora capturado não tem grandes semelhanças físicas com o suspeito da camisa amarela, e houve um jornalista que teve a coragem de perguntar se era apenas um bode expiatório, estragando logo o ambiente que ali se tentava criar: "Tu és tailandês?", retorquiu o Chefe da Polícia terminando de imediato com a conferência de imprensa.


Ontem ao final do dia já se anunciava que afinal se tratava de uma rede bombistas, e hoje procurava-se o paradeiro da senhoria tailandesa que arrendou o apartamento a estes meliantes, mais tarde se revelando que esta se encontrava a morar na Turquia e casada com um turco. Durante a tarde é reportado que numa operação conjunta, as Polícias da Tailândia e do Camboja capturaram o suspeito da camisa amarela numa cidade fronteiriça. Este foi transportado de helicóptero até Bangkok, e a Polícia anuncia em conferência de imprensa que existem mais suspeitos a monte (todos turcos aparentemente), revelando mais retratos-robô e imagens pouco nítidas de uma foto de passaporte.

Espero sinceramente que esta situação se resolva e que a Polícia Tailandesa seja capaz de encontrar todos os responsáveis por este atentado. Não tanto por achar que eles merecem um castigo exemplar e que devam ser usados como bandeira contra um determinado grupo, mas que principalmente se descubram as razões pelas quais o fizeram e o que se pode fazer para evitar que algo semelhante volte a acontecer. Hoje em dia muito se fala de crises de emigração um pouco por toda a Europa, mas sem dúvida que este é um problema global, onde milhares de apátridas sem rumo tentam procurar outra vida num lugar melhor, como os milhares de Rohingya que se encontram presos em barcos no Índico sem ter um país que os aceite. Se a comunidade internacional decidir ignorar ou repelir estas pessoas, é natural que os conflitos surjam e a violência escale, pois estão a dar razão aos argumentos usados pelos grupos extremistas que hoje mancham o Mundo com as suas atitudes deploráveis.


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